sexta-feira, 12 de agosto de 2011

De um só fôlego:


"o sentido da vida é viver, e viver significa estar consciente,
jubilantemente, embriagadamente, serenamente
consciente" (Henry Miller)


1 - as costas em chamas; piratas!

Eu acho que uma boa razão para se piratear informação é tornar a arte institucional - e seus derivados da indústria cultural - um mau negócio. "Os artistas vão ficar sem dinheiro", gritam os pop stars e os oportunistas. Balela. Começo dizendo que os melhores artistas fazem o que fazem porque lhes é um imperativo, uma necessidade biológica, uma chama que vem de dentro ou um vento que sopra do futuro em seus ouvidos - eles farão o que fazem ganhando dinheiro ou não. Eles são fetichistas, são tarados, pela criação e seus requintes - pela invenção, pelo detalhismo, pelo aprofundamento. E portanto os músicos contraculturais coexistem nas galerias subterrâneas com os nerds que fazem da programação uma arte - e com isso, formentam a cultura open source.

A tara da criação pode movimentar dinheiro, o fará se necessário - mangueará na rua como um hippie, de bike no sinal como um Celton, vendendo poesia no trem e no botequim como tantos poetas ao meu redor - e o fará bem feito, se o fizer com paixão. Talvez seja necessário esforço, mas que se foda! Estamos vivos e nos esforcemos então. O que importa é que o melhor da arte é feito com espírito de doação - como ato de excesso, de abundância, de transbordamento - porque a arte é a invenção de uma comunitariedade, de uma contracultura, e porque a contracultura e a comunitariedade são a arte de inventar uma cultura - o resto é mesquinharia, burocracia, o resto é escassez com uma embalagem reluzente, o resto é espetáculo. Viveremos melhor com menos Britney Spears e portanto mais dinheiro pros menores, e que Hollywood se expĺoda. E que os artistas aprendam a se fazerem necessários, pra pessoas de fato, e não para um "público" genérico. (É imprescindível impedir o público de entrar, dizia Breton), que eles se façam necessários cultivando a vida, as florescências semióticas, as sinestesias, as reminescências, as vertigens, as inversões de perspectiva, os mise-en-abysme, as transgressões de protocolo, etc. Que eles não tenham dinheiro e então tenham que rachar casas com outros artistas para, quem sabe, aprenderem a conviver com seres humanos. Que eles reassumam seu lugar como inventores de um mundo e façam proliferar a invenção, que eles espalhem o Maravilhoso e inspirem as lutas e o desejo de liberdade ou não e etc. Que sejamos todos artistas, nesse sentido!

2 - Mãe Monstro

O surrealismo é interpretado com muita má vontade, babação de ovo pro Dali, o tedioso minotaurismo de Bataille, e toda aquela paranóia sobre a irracionalidade. Mas o surreal não é o imaginário, a besta não merece ocupar o lugar de deus, esse lugar não merece existir, e por isso mesmo o surrealismo é o inimigo declarado do pai, do estado, da religião, de forma que ele não pode ser fascista, PONTO. O que o surrealismo adiciona ao dadaísmo é a perspectiva da revolução - uma espécie de além-da-crítica - a percepção clara de que a revolução proletária TEM DE SER a revolução da capacidade vital, criativa, inspirada do homem, ou isso ou se converte em mera reorganização burocrática da repressão. E nesse ponto Reich e suas vegetações encontra Breton e seus automatismos e a trama se tece, Crowley e sua era de Hórus, "Faça o que tu queres", Fernando Pessoa escreve o Hino a Pã, os beats se lançam à estrada e os hippies se lançam ao viver comunitário e na Espanha o anarquismo se instala em Barecelona, Henry Miller larga seu emprego e vive de pedir empréstimos e irradiar sua energia, Estamira manda o capital se fuder e vai viver no lixão, pregando seu verso livre profético, Artaud morre agarrado a um sapato num hospício enquanto sua gargalhada ecoa nas ondas AM, Piva encontra os Anjos de Sodoma e Ginsberg vê Moloch, os Tropicalistas e os canibais e os "índios" e muitos outros.

Lady Gaga? Entedia-me com sua fantasia brega cobrindo o corpo católico. Estará passé muito rápido. Sua ficção científica é decadente, suas roupas saíram de moda nos 80, e no entanto você é realmente importante, um marco, uma espécie de versão cooptada do Dali ou uma Kate Bush empalidecida e sintética. Você é o veneno de Dada finalmente atingindo a música pop, o estertor de morte da indústria cultural. Você é uma ironia ambulante, tão cônscia de si e de sua artificialidade - você é um ciborgue e cria como um ciborgue. De certa forma é um monstro - mas não porque é visceral, e sim porque é construída, porque denuncia toda a construção e torna evidente a agonia que é o interpretar. Você é a primeira estrela cyber-punk, uma projeção perversa em neon. Você cheira a decadénce e por isso me entedia, você cheira à derroacada e desmoronamento do império americano, você cheira a invasões bárbaras & o dinheiro finalmente dá uma volta ao mundo sentido leste e retorna à China, à China que há milhares de anos foi o centro do mundo com a rota da seda. E é o fim.

Já a Kate Bush tem meu respeito

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