segunda-feira, 27 de abril de 2020

Uma garça canta na obscuridade [Lua em Câncer - Segunda-feira, 27 de abril a Quarta-feira 29 de Abril]


Segunda-feira: Mercúrio chegou hoje no fim da tarde a Touro, signo fixo de terra. O planeta que governa as comunicações vinha cruzando Áries em altíssima velocidade - logo Áries, que está entre os signos cardinais, associados a inícios e a movimentos - logo Áries, signo de fogo que arremete com a cabeça. Espero que tenham aproveitado o Mercúrio britadeira pra abrir caminho à força entre os problemas.

Agora, em Touro, Mercúrio funciona em outro ritmo; Touro é bixo manso, ruminante. Pra construir algo sólido é preciso pensar bem onde colocar os tijolos, medir as palavras, refletir no que lhe foi dito. Mercúrio e Vênus estão em uma situação chamada generosidade: não se aspectam, mas estão um na casa do outro. Relação de confiança entre planetas que não se enxergam, mas miram em um objetivo comum. Lembro agora de uma linha do I-Ching: "Uma garça canta na obscuridade: Tenho um bom vinho, posso compartilhá-lo contigo". Mesmo sem vê-la, o filhote ao ouvir seu pio sabe que a mãe-garça trás algo de bom. Mercúrio é a comunicação, Vênus a beleza; bonito é comunicar com calma e gentileza; a beleza também é útil, também abre portas.

A Lua entra também em Câncer na segunda-feira, onde fica até a noite de quarta. A noite de segunda é marcada por um sextil com o Sol, a primeira badalada do relógio do mês da Lua, que começou quarta-feira passada. Sol no signo que exalta a Lua, Lua na sua casa: uma noite boa pra sonhar, dormindo ou acordado. O ser humano é uma raça anfíbia; habitamos não só no corpo, mas também a imaginação - essa umidade da mente que a torna fértil e capaz de criar suas próprias formas de vida.


A rigor, nada disso que ela cria é real; a imaginação só presta se servir de alguma forma pra vida concreta. Mas como saber de antemão o que serve e o que não serve? Há sempre um risco na criação, não tem como ter garantias. Mas é possível se assegurar, pelo menos, de que a criação tem *princípio*: se a base da criação imaginativa é um salto rumo à vida, e não uma fuga da vida. Quando a base é boa, o que surge daí tende a ser bom também. Da mesma forma, podemos julgar uma criação pelos seus frutos: quando lemos um livro, vemos uma série, um filme - ou mesmo quando sonhamos acordados! - logo depois que acaba, o que resta conosco?

As vezes parece que uma névoa doce se desfez, e sou devolvido a realidade fraco, confuso e desamparado. É assim que me sinto quando consumo a maioria do cinema, jogos, livros e séries mainstream, da indústria cultural. Hollywood, novelas, etc; em sua maioria são escapismo. Nossa cultura é uma cultura escapista. E se escapar as vezes faz parte - adiando os problemas pra um momento melhor - não se pode viver só disso. É como tentar se nutrir só comendo açúcar.

Por contraste: esses dias zerei um jogo chamado Undertale, cria de um desenvolvedor indie chamado Toby Fox. Aclamado por muitos como o melhor jogo de 2015, Undertale foi pra mim mostrou como uma única pessoa é capaz de criar em 8 meses um jogo capaz de esfregar no chão a cara de uma indústria milionária. Tudo porque ele tem princípio; um jogo que tem coração. (Sem querer gastar demais o tempo de vocês - Undertale é um jogo de RPG onde você não precisa matar os monstros. É possível ir do começo ao fim do jogo resolvendo todas as tretas com muita conversa e jogo de cintura. E cada vez que você escolhe matar alguém, o jogo te lembra quão sério isso é). Agora, vários dias depois de ter zerado o jogo pela primeira vez, eu percebo que ele cresceu em mim. Eu gosto mais ainda dele do que quando terminei. Eu revisito as memórias do jogo e percebo que elas me nutrem. Isso é a marca de uma boa criação, de uma criação que tem princípio.

A Lua fica em Câncer sem mais aspectos até quarta-feira, quando finalmente completa a oposição a Júpiter no fim da tarde. A oposição a Júpiter em Capricórnio é sobre a dificuldade de manter a fé em situações difíceis. A Lua em Câncer exalta Júpiter, porém o planeta gigante está no signo de sua queda, Capricórnio, um lugar de duro realismo. A esperança pode ser algo cruel. É perigosa, a esperança, pois é uma aposta no futuro, no que não podemos controlar. Melhor seria concentrar a fé no presente, uma fé momento a momento, uma fé no fluxo e não nos resultados. Assim prega a Lua em Câncer, que escorre conosco por mais uma semana de isolamento...

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Iago Pereira

Imagem: Ohara Koson, "Garça-real branca em pé na chuva" - 1928.

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