Recentemente um leitor anônimo me contatou em resposta ao
Ensaio sobre a insanidade cotidiana, e o comentário e minha resposta viraram o post
Notas para uma Guerrilha Psíquica. Agora, ele postou outro comentário, e eu como de costume me alonguei de novo e decidi tornar a conversa novamente em um post.
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Remedios Varo, "Alegoria do Inverno" |
(...) Como mencionei, é uma realidade diferente da minha. Sou das ciências exatas, da ordem e da lei (inclusive projetando nanomáquinas de guerra), mas há um centelha que busca um caminho diferente. Isso evoca uma (singela) lembrança de um documentário com aquela experiência do labirinto e dos ratinhos. Observavam que após um tempo, o ratinho já tendo assimilado o caminho correto e o executando com perfeição, começava com um comportamento anormal, procurando um caminho diferente. Era associado a inteligência. Poderia encontrar uma ilha maior de queijo. Sinto-me desta forma. Objetivamente e de forma calculada (gostaria de colocar numa prancheta). Acho que esse comportamento é instintivo. A respeito de objetivo, é interessante(íssimo, na verdade) o sucesso consistindo na falha... pois a liberdade plena não me parece sinônimo de felicidade. Paradoxalmente só encontro um pouco de serenidade quando restrinjo voluntariamente minha liberdade... nós somos "feitos de tristeza devido ao vazio que nos constitui e à liberdade sem limites que nos assusta"? Por hora persigo o poder (e o esforço/estudo/conhecimento que mencionou para mim são facetas dele), principalmente sobre mim - não encontrei (ainda) a finalidade disto... mas parece... sei lá... um caminho.... Quanto a essas drogas, sempre me preocupam o poder de adicção e... flashbacks.....? (...) (Ass: Anônimo)
Oi anônimo, valeu por voltar pra continuar a conversa! Seu comentário me abre muitas coisas pra problematizar. A primeira é que sugiro uma distinção entre poder e potência. Você não é obrigado a aceitar minhas definições, mas ofereço-as porque podem quiçá lhe ser úteis pra pensar! - pra mim foram...
Sei que no uso comum a gente fala como se poder e potência fosse a mesma coisa, mas na hora de pensar politicamente há dois fenômenos diferentes em jogo. Poder é segundo Deleuze "o grau mínimo da potência", e tende ao controle, à restrição, à contenção. Poder é "hetero-regulado", centrado no outro; se realiza apenas através do outro, ao mesmo tempo que reprime, suprime ou diminui o outro: "sou poderosos porque mando e desmando e os outros me obedecem", "olha como sou poderoso, todos admiram minha esposa / carro / roupas / etc". A sede de poder tem sua origem biológica na restrição da potência - quanto mais potente a pessoa é, menos ela precisa dos outros pra sentir-se segura de si.